Garantir a privacidade e “ciber-liberdade” dos munícipes é um dos maiores desafios da gestão autárquica em contexto de transformação digital, considerou Marco Espinheira, em conferência organizada pela EY Portugal. O “director do futuro” na Câmara de Cascais defendeu que essa função terá de ser do Estado porque os cidadãos não se vão importar com o problema.
O desafio tende a ser ainda mais melindroso tendo em conta o que confirmou: “com os dados recolhidos conseguimos saber muita coisa, desde a hora a que chegam a casa e se têm filhos, por exemplo”. Mas ao mesmo tempo, a participação dos cidadãos com a partilha dos seus dados é vista como fundamental, por Espinheira.
A Câmara Municipal de Cascais implantou uma plataforma de autenticação que o responsável considerou como um “game changer”. Um elemento de mudança radical de abordagem, baseada na identificação do cidadão online: uma plataforma que providencia uma identidade ao munícipe e o autentica também perante os fornecedores externos de serviços.
Servirá para suportar a oferta de “mobilidade como serviço” do concelho, ao acolher o processo de pagamento e receitas do mesmo. “Só assim conseguimos sentar à mesma mesa a Uber e os taxistas” explicou. Um dos principais desafios de Lisboa também está ligado à administração de dados.
O vice-presidente da Câmara Municipal, Duarte Cordeiro vincou a urgência de haver um modelo de negócio para a partilha de elementos de informação com parceiros, no âmbito das iniciativas de dados abertos. A fórmula não “é clara” e é necessário acelerar a definição de um “modelo de partilha de valor” capaz de proteger o interesse público na exploração dos dados, referiu.
Paulo Fernandes (Fundão) considerou importante haver “uma segunda vaga de abertura de centros de competências mais focados na transferência de tecnologia”.
Envolve gerir o valor das redes pertencentes à câmara, como as de iluminação e de semáforos, interessantes pela sua capilaridade. Com a consolidação da implementação do centro de operações integrado, Duarte Cordeiro, considera importante incorporar nele mais informação útil e para isso é necessário investir em infra-estrutura (como por exemplo na instalação de sensores).
Depois de considerar que as empresas de software não respondem à necessidades das autarquias, o presidente da Câmara Municipal de Águeda enfatizou o valor das redes de iluminação e o desafio que é optimizar o seu aproveitamento.
O poder local português estará a “perder o comboio” nesse tema, mas é possível “colocar inteligência suportada pela rede, disponibilizar serviços e e fazer controlo de tráfego com câmaras”, exemplificou. Contudo “estamos apenas a substituir ponto de luz por pontos de luz”, criticou.
Tanto este autarca, como Paulo Fernandes, presidente da Câmara do Fundão, vincaram a importância de suportar a “tutoria” ou ensino à distância. Nadais considerou mesmo que será uma forma de mudar a atitude das pessoas para o uso de serviços digitais, através do sistema de ensino.
“Mas interessa também manter as competências de atendimento [na administração local]”, avisou.
Paulo Fernandes considerou ainda que um dos maiores desafios do poder local será conseguir “democratizar a inovação”. Nesse contexto, o autarca da cidade onde a Altran tem uma unidade de desenvolvimento de software, defende a necessidade de “ter uma segunda vaga de centros de competências mais focados na transferência de tecnologia”.
Além disso, a comunicação dos serviços existentes ao cidadão parece ser um problema transversal. Tal como a garantir a interoperacionalidade dos sistemas internos da câmara e com o exterior.
Outro dos problemas, assinalado por Paulo Fernandes, é a capacidade de avaliação dos impactos das iniciativas. O autarca não fica satisfeito com “índices de satisfação” gerais.
Parcerias são formas de resolver contratação
Face à importância das competências dos recurso humanos, mas também aos salários dos programadores praticados Marco Espinheira (Cascais) considerou importante definir novos modelos de contratação. O responsável já se deparou com profissionais a pedirem entre 2500 e 3500 euros mensais. No seu entender estabelecer parcerias como aquela que Cascais mantém com a Citypoint é uma solução.
A startup surgiu num concurso promovido pelo município com uma aplicação móvel de gamificação, sobre o qual foi desenvolvido um programa de fidelização. Nele os cidadãos utilizadores vão ganhando pontos com as suas boas práticas em benefício do concelho e dos quais podem usufruir nos serviços de outros parceiros.
A plataforma pode ser precursora de iniciativas ainda mais “interessantes”: a cobrança de taxas de lixo e estacionamento diferenciadas para os munícipes de acordo com vários critérios. Quem trabalha dentro do concelho poderá ter tarifas mais baixas para arrumar o carro, exemplificou.
Contudo Gil Nadais defendeu a necessidade de haver maior flexibilidade para o que denominou “modelos colaborativos” visando a “redução” de custos. Na perspectiva de Paulo Fernandes os municípios têm de avançar para implantação de serviços à escala das Comunidades Intermunicipais. E com espírito de maior “coesão” defendeu.